"Todas aquelas lindas crianças são esterilizadas até ao fim desse ano escolar de 1936-37: A Shirley Temple da Silésia, a Mónica, o Volker, a VV, a Gnendl...O que me faz pensar na altura como é que os cirurgiões e médicos da Alemanha conseguiam dormir à noite. Mais tarde, claro, viremos a saber que dormiam perfeitamente.
Um dia, o Volker pega num desenho que fiz dele e desenha estrelas por cima da cara toda. Fico furiosa, porque trabalhei bastante para fazer um retrato fiel, e exijo-lhe, com voz de má, que me diga, o que está a fazer. Arrepiando-se, responde: - A varrer folhas secas.
Quando lhe saltam as lágrimas dos olhos, ajoelho-me ao pé dele e peço-lhe desculpa. Ele cai-me nos braços, e eu abraço-o com força, implorando-lhe que me perdoe. Desde então, sempre que um dos miúdos me perguntava porque estava a fazer qualquer coisa que eles achassem estranho, respondia muitas vezes «A varrer folhas secas» antes de dar a minha verdadeira explicação, o que fazia sempre com que o Volker e eu sorríssemos em simultâneo.
Abraçar aquele miúdo lindo que me treme nos braços é um momento importante para mim: não me tinha apercebido do poder que tinha sobre estes pequenos seres. Nem de que até então ainda estava a reprimir uma grande parte do meu amor, pensando que os professores não deviam mostrar o seu coração aos alunos.
Devemos ser suaves, suaves, suaves uns com os outros, porque somos muito frágeis... É o que os meus miúdos me ensinam nesse ano, e é uma lição que eu precisava muito aprender."
Richard Zimler, in a Sétima Porta, pag. 478 e 479.
2 comentários:
Um dos meus autores preferidos. Neste momento estou a ler "Os anagramas de Varsóvia" e recomendo.
Obrigado pelas visitas ao Rochedo.Só hoje pude retribuir e gostei de ler este post. Vou continuar.
Obrigada Carlos. Também gosto de o ler, mesmo se nem sempre concordamos.
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