O Grão Kan contempla um império recoberto de cidades que têm peso sobre a terra e sobre os homens, a abarrotar de riquezas e de movimento, repleto de ornamentos e de incumbências, complicado de mecanismos e de hierarquias, inchado, largo, pesado.
«É o seu próprio peso que está a esmagar o império», pensa Kublai, e nos seus sonhos ora surgem cidades leves, como papagaios de papel, cidades perfuradas como rendas, cidades transparentes como mosquiteiros, cidades nervuras de folhas, cidades linhas da mão, cidades filigrana para ver através da sua opaca e fictícia espessura.
-Vou contar-te o que sonhei esta noite - diz a Marco.
-Vou contar-te o que sonhei esta noite - diz a Marco.
- No meio de uma terra plana e amarelada, salpicada de meteoritos e massas errantes, via ao longe elevar-se os coruchéus de uma cidade de finos pináculos, feitos de maneira que a Lua no seu caminhar possa pousar ora num ora noutro, ou balançar-se pendurada nos cabos das gruas.
E Polo: - A cidade com que sonhaste é Lalage. Os seus habitantes fizeram estes convites ao repouso no céu nocturno para que a Lua conceda a todas as coisas na cidade o dom de crescer e tornar a crescer sem fim.
- Há uma coisa que tu não sabes - acrescentou o Kan.
- A Lua reconhecida deu à cidade de Lalage um privilégio mais raro: o de crescer em leveza.
Italo Calvino in As Cidades Invisíveis.
Foto de Jorge Henriques (1912-1988)
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