A neve é a chuva vestida de noiva.
Devemos ser suaves, suaves, suaves uns com os outros, porque somos muito frágeis...
sábado, 31 de outubro de 2009
Treze Maneiras de Olhar um Melro
1
No meio de vinte montanhas nevadas
A única coisa que se mexia
Era o olho do melro.
2
Eu via as coisas de três maneiras diferentes,
Como uma árvore
Onde há três melros.
3
O melro rodopiava ao sabor dos ventos de Outono.
Era uma pequena parte da pantomima.
4
Um homem e uma mulher
São um.
Um homem e uma mulher e um melro
São um.
5
Não sei qual prefiro,
A beleza das modulações de som
Ou a beleza das insinuações,
O melro a assobiar
Ou logo após.
6
Gotículas geladas cobriam a grande janela
De vidros toscos.
A sombra do melro
Cruzava-a, dum lado para o outro.
O estado de espírito
Desenhava na sombra
Uma causa indecifrável.
7
Ó homens esguios de Haddam
Por que pensais em pássaros dourados?
Não vedes como o melro
Caminha à volta dos pés
Das mulheres perto de vós?
8
Sei de sotaques notáveis
E ritmos lúcidos e inevitáveis;
Mas também sei
Que o melro está presente
Em tudo o que eu sei.
9
Quando o melro voou para fora do alcance da vista
Assinalou a orla
De um de muitos círculos.
10
Perante a visão de melros
Voando envolvidos numa luz verde,
Até os proxenetas da eufonia
Haviam de gritar com vivacidade.
11
Ele foi até Connecticut
Num coche de vidro.
Uma vez, foi tomado de pânico
Quando confundiu
A sombra da carruagem
Com melros.
12
O rio corre.
O melro deve andar a voar.
13
Anoitecia em cada instante da tarde.
Nevava
E ia continuar a nevar.
E o melro empoleirado
Nos ramos dos cedros.
Wallace Stevens (1879-1955), in SIMÕES, António, Antologia de Poesia Anglo-Americana, de Chaucer a Dylan Thomas, Porto, Campo das Letras, 2002, p.409-413
Treze Maneiras de (Não) Colher Uma Rosa.
I
Colocam-se as mãos à volta da rosa,
sem lhe tocar,
para lhe roubar a forma,
das pétalas ao pé.
II
Toca-se na rosa com a boca,
até nossos lábios serem pétalas.
III
Aspira-se-lhe o perfume intensamente,
até substituir o sangue
em nossas veias por inteiro.
IV
Fecham-se os olhos,
e, como num sonho,
levamos a rosa para dentro
do nosso coração.
V
Embrulha-se a rosa no nosso olhar,
atada com os fios do vento.
VI
Atrai-se a rosa a um encontro,
num lugar secreto da nossa alma,
e não se deixa mais sair de lá.
VII
Olha-se a rosa fixamente,
e com o fio de aço do nosso olhar,
corta-se-lhe o pé.
VIII
Tira-se todo o jardim à volta da rosa,
para que ela venha até nós,
ferida de solidão.
IX
Captura-se-lhe a chama
quando a sua cor se confunde
com o poente ou o raiar da manhã.
X
Deixa-se que o crepitar da rosa
entre em nossa alma,
misturado com o sussurrar de uma seara.
XI
Faz-se-lhe uma emboscada
quando o vento da tarde
transporta o seu perfume
dum lado para o outro.
XII
Esperamos pacientemente
que se dilua no orvalho que a cobre toda,
e bebemo-la depois,
gota a gota.
XIII
Deixamos a rosa, livre, intacta,
para a podermos colher,
uma e outra vez,
com a avidez dos nossos sentidos.
ANTÓNIO SIMÕES
*Glosa do título de Wallace Stevens,
"Treze Maneiras de Olhar um Melro"
trilho do Amor.
e o campo até ao horizonte possível
explode em violeta e azul, dedos florescem
para as delícias do tacto num vibrátil
orvalho. Imagina
que eu parti e o ar impregnado de mim
queima; ou o horizonte se tornou num duvidoso pousio,
retráctil, sem gosto nem cheiro, apesar de os lagos
a si atraírem o voo predador de fulminantes aves, e o receio
seca a boca. Imagina esse género de pânico:
flores envolvidas ao contrário, tu: solitária, imagina
o Mundo cego. Imagina que me resguardarei
dentro das minhas próprias veias
no esquecimento de tal ausência a brotar
em tons rubros, borbotões sobre ti. O campo
o campo, o campo, o campo...
Agora
imagina (é sábado) toquei-te
por assim dizer demasiado...excessivamente,
ao nível onde o ventre cristaliza o vidro
do coração, ou abaixo, no preciso
sitio do nome, teu
medieval nome. E despes o género feminino desse elmo,
num gesto descobres o perfume sob
a cota leonina de uma dança, um feitiço, isso, agora
que é um magnífico sábado permanente, imagina
Cintilações de uma vertigem trágica rasgam
o peito à aventura, a horizontes incontornáveis.
Pela margem da cultura a mim chegaste
e agora, bem, agora
é a galhofa de jogar às escondidas, a refeição
doméstica, o vestir, o calçar, fantasia de tantos pequenos nadas,
entradas subterrâneas, saídas de leão
directas à turbulência do astral. Imagina,
amizade me pediste-dou-te a Noite,
o alvor, sua leve frescura, intactas tardes. Agosto
existe
só para consolidar-nos
contra o cerco
de inumeráveis aguas sujas no subúrbio da inteligência.
E tarde é para ter juízo e cedo...ah cedo o medo
nos surpreenderá, de pueril. Eles ignoram
a autêntica demência de como
sábado nos entrou nos ossos e não sai: toco-te, escalda-
ou apenas o motor da ternura
apela a um ritmo menos trepidante? Um amor
que se vai adivinhando e, adivinhando
também, indica o trilho do Amor.
Paulo da Costa Domingos, in Espacio/Espaço escrito (revista de literatura en dos lenguas)
sexta-feira, 30 de outubro de 2009
quarta-feira, 28 de outubro de 2009
Páginas excepcionais # 6 "São asas"
Foto do meu filho de 10 anos
José Saramago Deste Mundo e do Outro, jornal A Capital, 1968/69.
A praça tem uma estátua de bronze: um homem alto, escuro, mais alto ali que qualquer de nós. Em todo o caso, há semelhanças entre a estátua e quem passa no largo. Tirante as diferenças do trajo, é o mesmo vulto, o mesmo perfil. Dizem que é Luís de Camões. Será. Uma vez por ano põem-lhe ramos de flores aos pés, com um misto de compungimento e pressa, assim como quem vai apresentar pêsames por um morto que não nos é nada. Chamam-lhe Luís de Camões, e está morto. Desde 1580 que está morto, vai fazer quatrocentos anos. Quando os fizer, haverá comemorações especiais, cortejos cívicos, récitas populares ou não, discursos-talvez um banquete. Mas o velho Luís Vaz, a quem por más acções chamaram Trinca-Fortes, continuará morto.
Este homem, no fundo, não é nosso parente. porque o parentesco não tem nada que ver com o lugar do nascimento e os laços de família. Parente, irmão, é carne e sangue, espírito e comunhão de espírito. E que comunhão existirá entre nós que passamos no largo e o poeta sobre quem o tempo passa e repassa? A sua voz está trancada nos lábios de bronze. Os ecos dessa voz, que ressoam de verso em verso, como entre montanhas que se falam e respondem, não chegam aos duros ouvidos deste tempo. A hora não vai para poetas, mesmo se os imortalizaram em bronze. A estátua é uma justificação, o remorso de um desamor.
Estas vozes, poderosas ou débeis, estas vozes de poetas que vão acompanhando o correr dos dias, plantando ao lado das estradas flores e árvores de flores - como é possível pensar que uma figura de mármore ou de bronze, ou, mais modestamente, uma lápide à esquina da rua, lhes dará corpo e ressonância?
Bem sabemos que a vida tem exigências imediatas, que é difícil a alguém, de cada vez que ali passa, dizer com os seus outros pensamentos: «É Luís de Camões, meu irmão reconhecido e amado .» Não é possível aguentar isto de descer ou subir a rua e levar na alma alguma coisa daquela alma heróica. (Heróica, porquê? Mas deixemos ficar o lugar comum.) A nossa vida breve, acomodada até nas negações, não suportaria o bafo vibrante daquele fogo que ali arde invisivelmente. Aqui viriam a propósito os pombos, seria altura de dizer que Luís de Camões está coroado de asas, e até, com um pequeno esforço, que nessas mesmas asas delegámos a nossa veneração e o nosso amor. Coitados dos pombos. Coitados de nós.
Daqui por um ano, terás mais flores aos pés. Daqui por um ano (e que é um ano para ti?), não sei se voltarei a dizer-te estas coisas ou outras coisas. Pouco importa, afinal. As palavras não dizem tudo quanto é preciso. Diriam mais, talvez, se fossem asas. Delego também nos pombos a tua coroação. E vou à minha vida, Luís de Camões, com muita pena de não levar a tua. Até para o ano, irmão. Até para o ano. Tem paciência e espera. Há em Portugal cerca de dez milhões de habitantes. Ainda tens muitas probabilidades.
FIM
José Saramago Deste Mundo e do Outro, jornal A Capital, 1968/69.
terça-feira, 27 de outubro de 2009
Plumas Vermelhas na Seara
Vi nos teus olhos uma semente.
Perguntei onde a guardaste.
Disseste-me que eras o vento que acaricia a seara.
Eu disse-te que era o sol que a torna dourada.
Trocamos de olhos.
Enrolamos as mãos.
Perguntei onde a guardaste.
Disseste-me que eras o vento que acaricia a seara.
Eu disse-te que era o sol que a torna dourada.
Trocamos de olhos.
Enrolamos as mãos.
Esgueiramo-nos em silêncio.
Quando só os espantalhos guardavam a seara.
Semeamos nela plumas vermelhas e ondas de lava salgada.
Quando só os espantalhos guardavam a seara.
Semeamos nela plumas vermelhas e ondas de lava salgada.
A seara ondulou voluptuosa, entornando o aroma grávido do trigo
Publicado originalmente noutro blog de que sou colaboradora, embora com nome não totalmente coincidente.
Cultura e Civilização
Uma mesa cheia de feijões.
O gesto de os juntar num montão único. E o gesto de os separar, um por um, do dito montão.
O primeiro gesto é bem mais simples e pede menos tempo que o segundo.
Se em vez da mesa fosse um território, em lugar de feijões estariam pessoas. Juntar todas as pessoas num montão único é trabalho menos complicado do que o de personalizar cada uma delas.
O primeiro gesto, o de reunir, aunar, tornar uno, todas as pessoas de um mesmo território é o processo da CIVILIZAÇÃO.
O segundo gesto, o de personalizar cada ser que pertence a uma civilização é o processo da CULTURA.
É mais difícil a passagem da civilização para a cultura do que a formação de civilização.
A civilização é um fenómeno colectivo.
A cultura é um fenómeno individual.
Não há cultura sem civilização, nem civilização que perdure sem cultura.
Almada Negreiros, in "Ensaios"
O gesto de os juntar num montão único. E o gesto de os separar, um por um, do dito montão.
O primeiro gesto é bem mais simples e pede menos tempo que o segundo.
Se em vez da mesa fosse um território, em lugar de feijões estariam pessoas. Juntar todas as pessoas num montão único é trabalho menos complicado do que o de personalizar cada uma delas.
O primeiro gesto, o de reunir, aunar, tornar uno, todas as pessoas de um mesmo território é o processo da CIVILIZAÇÃO.
O segundo gesto, o de personalizar cada ser que pertence a uma civilização é o processo da CULTURA.
É mais difícil a passagem da civilização para a cultura do que a formação de civilização.
A civilização é um fenómeno colectivo.
A cultura é um fenómeno individual.
Não há cultura sem civilização, nem civilização que perdure sem cultura.
Almada Negreiros, in "Ensaios"
Balada para um Homem na Multidão
Este homem que entre a multidão
enternece por vezes destacar
é sempre o mesmo aqui ou no japão
a diferença é ele ignorar.
Muitos mortos foram necessários
para formar seus dentes um cabelo
vai movido por pés involuntários
e endoidece ser eu a percebê-lo.
Sentam-no à mesa de um café
num andaime ou sob um pinheiro
tanto faz desde que se esqueça
que é homem à espera que cresça
a árvore que dá dinheiro.
Alimentam-no do ar proibido
de um sonho que não é dele
não tem mais que esse frasco de vidro
para fechar a estrela do norte.
E só o seu corpo abolido
lhe pertence na hora da morte.
Natália Correia, in "O Vinho e a Lira"
enternece por vezes destacar
é sempre o mesmo aqui ou no japão
a diferença é ele ignorar.
Muitos mortos foram necessários
para formar seus dentes um cabelo
vai movido por pés involuntários
e endoidece ser eu a percebê-lo.
Sentam-no à mesa de um café
num andaime ou sob um pinheiro
tanto faz desde que se esqueça
que é homem à espera que cresça
a árvore que dá dinheiro.
Alimentam-no do ar proibido
de um sonho que não é dele
não tem mais que esse frasco de vidro
para fechar a estrela do norte.
E só o seu corpo abolido
lhe pertence na hora da morte.
Natália Correia, in "O Vinho e a Lira"
domingo, 25 de outubro de 2009
Brando no Auge
A maior lenda da história do cinema.
Abençoado com a beleza e corpo de um Aquiles.
Brando é a escultura.
É o instinto.
O vício.
A sensualidade.
O desejo.
A violência contida e em explosão.
A contenção de gestos.
A explosão de sentimentos.
A revolta.
Ele mostrou-se assim.
Mas quem era ele?
Stanley? Terry Malloy? Marco António? Paul?
Nehum deles.
Era, certamente, um esteta.
Um perfeccionista.
E um taciturno orgulhoso e destrutivo.
Consulta: Movie Icons, BRANDO, Editora Taschen
Publicado originalmente noutro blog de que sou colaboradora, embora com nome não completamente coincidente.O pórtico das horas
Eu sou um pedaço de mar.
Eu sou a água que desce às profundezas,
das sombras milenares.
Sempre estive aí, adormecida.
A prolongar os enigmas, dos rochedos
aveludados de verdes plumas.
A envolver-me nas geadas das vagas luminosas.
A ouvir as vozes das águas.
Vendo um fio de luz que brilhou ao longe parti
à procura do luar salgado.
Quando cheguei o mar sabia a saudade.
A barca estava desolada e coberta de limos.
A lua já tinha ido visitar outro sonho.
Perdida fiquei no pórtico das horas.
Adivinhando uma eternidade silenciosa.
Eu sou a água que desce às profundezas,
das sombras milenares.
Sempre estive aí, adormecida.
A prolongar os enigmas, dos rochedos
aveludados de verdes plumas.
A envolver-me nas geadas das vagas luminosas.
A ouvir as vozes das águas.
Vendo um fio de luz que brilhou ao longe parti
à procura do luar salgado.
Quando cheguei o mar sabia a saudade.
A barca estava desolada e coberta de limos.
A lua já tinha ido visitar outro sonho.
Perdida fiquei no pórtico das horas.
Adivinhando uma eternidade silenciosa.
Originalmente publicado noutro blog de que sou colaboradora, embora com nome não completamente concidente
deus dos exércitos
"Está visto que a guerra é um negócio de primeira ordem, talvez seja mesmo o melhor de todos a julgar pela facilidade com que se adquirem do pé para a mão milhares e milhares de bois, ovelhas, burros e mulheres solteiras, a este senhor terá de chamar-se um dia deus dos exércitos, não lhe vejo outra utilidade, pensou caim, e não se enganava.
É bem possível que o pacto de aliança que alguns afirmam existir entre deus e os homens não contenha mais que dois artigos, a saber, tu serve-nos a nós, vocês servem-me a mim."
José Saramago, in Caim, pag. 112 e 113.
Caim
sábado, 24 de outubro de 2009
Direitos Humanos
Aquela que tem o olhar na janela
Estou na janela verde de minha casa.
Ao longe
O navio no mar transparece
O linho no seu porão
O azul do mar levanta-se sombra
Do azul das flores do linho.
Vejo o campo de flores azuis do linho
Estende-se azul e palha ao infinito.
Entre o verde janela e o infinito
Há um flutuar ondulado
Que em sussurro se abandona ao azul céu.
Eu estou no meio do campo
Num vestido de puro linho
E o meu vestido passa por dentro dos caules floridos
E a minha pele arranha-se
No trigueiro roçagar das fibras vegetais.
Sinto a frescura do vento matinal
Sacudir o orvalho dos caules coloridos
Sinto ser flor azul e verde janela.
Estou na janela verde de minha casa.
Não sou o mar
Nem sou o céu
Não sou azul flor
Nem verde janela
Sou aquela que tem o olhar na janela...
Ao longe
O navio no mar transparece
O linho no seu porão
O azul do mar levanta-se sombra
Do azul das flores do linho.
Vejo o campo de flores azuis do linho
Estende-se azul e palha ao infinito.
Entre o verde janela e o infinito
Há um flutuar ondulado
Que em sussurro se abandona ao azul céu.
Eu estou no meio do campo
Num vestido de puro linho
E o meu vestido passa por dentro dos caules floridos
E a minha pele arranha-se
No trigueiro roçagar das fibras vegetais.
Sinto a frescura do vento matinal
Sacudir o orvalho dos caules coloridos
Sinto ser flor azul e verde janela.
Estou na janela verde de minha casa.
Não sou o mar
Nem sou o céu
Não sou azul flor
Nem verde janela
Sou aquela que tem o olhar na janela...
Publicado originalmente noutro blog de que sou colaboradora, embora com nome não completamente coincidente.
sexta-feira, 23 de outubro de 2009
O Sublime e a Humanidade
quinta-feira, 22 de outubro de 2009
páginas excepcionais # 5 "sombras gigantes"
Eles eram os homens e as mulheres da areia, do vento, da luz, da noite. Tinham surgido, como num sonho, no cimo de uma duna, como se tivessem nascido do céu sem nuvens e como se tivessem nos membros a dureza do espaço. Levavam com eles a fome, a sede que faz sangrar os lábios, o silêncio duro onde luze o sol, as noites frias, o clarão da Via Láctea, a Lua; com eles viajava a sua sombra gigante ao pôr do sol, acompanhavam-nos as ondas de areia virgem tocadas pelos dedos afastados dos seus pés. Tinham sobretudo a luz do olhar, que brilhava tão calaramente na esclerótica dos seus olhos.
J.M.G. Le Clézio, in Deserto.
Profecia de ilusõs * 10 " a aranha"
terça-feira, 20 de outubro de 2009
Dias de Férias
Uma ilusão
Yo sueño que estoy aqui
destas prisiones cargado,
y soñé que en otro estado
más lisonjero me vi.
Qué es la vida? Un frenesí.
Qué es la vida? Una ilusion, una sombra, una ficción,
y el mayor bien, es pequeño:
que toda la vida es sueño,
y los sueños, sueños son.
Calderón de La Barca, in Solilóquios de Sigismundo - La Vida es Sueño
domingo, 18 de outubro de 2009
Desconstruções * 11 "o conceito"
sábado, 17 de outubro de 2009
Profecia de ilusões * 9 "banhos de estrelas"
Desconstruções *8 " As gaiolas"
segunda-feira, 12 de outubro de 2009
domingo, 11 de outubro de 2009
O entardecer
Crescer em Leveza
O Grão Kan contempla um império recoberto de cidades que têm peso sobre a terra e sobre os homens, a abarrotar de riquezas e de movimento, repleto de ornamentos e de incumbências, complicado de mecanismos e de hierarquias, inchado, largo, pesado.
«É o seu próprio peso que está a esmagar o império», pensa Kublai, e nos seus sonhos ora surgem cidades leves, como papagaios de papel, cidades perfuradas como rendas, cidades transparentes como mosquiteiros, cidades nervuras de folhas, cidades linhas da mão, cidades filigrana para ver através da sua opaca e fictícia espessura.
-Vou contar-te o que sonhei esta noite - diz a Marco.
-Vou contar-te o que sonhei esta noite - diz a Marco.
- No meio de uma terra plana e amarelada, salpicada de meteoritos e massas errantes, via ao longe elevar-se os coruchéus de uma cidade de finos pináculos, feitos de maneira que a Lua no seu caminhar possa pousar ora num ora noutro, ou balançar-se pendurada nos cabos das gruas.
E Polo: - A cidade com que sonhaste é Lalage. Os seus habitantes fizeram estes convites ao repouso no céu nocturno para que a Lua conceda a todas as coisas na cidade o dom de crescer e tornar a crescer sem fim.
- Há uma coisa que tu não sabes - acrescentou o Kan.
- A Lua reconhecida deu à cidade de Lalage um privilégio mais raro: o de crescer em leveza.
Italo Calvino in As Cidades Invisíveis.
Foto de Jorge Henriques (1912-1988)
segunda-feira, 5 de outubro de 2009
talvez flores
Nevoeiro
Quem poderá saber que estaranha bruma
Brotou caladamente em minha volta
Pra que eu perdesse as horas uma a uma
Sem um gesto, sem gritos, sem revolta.
Quem poderá saber que estranhos laços
E que sabor de morte lento e amargo
Sugaram todo o sangue dos meus braços -
O sangue que era sede do mar largo.
Quem poderá saber em que respostas
Se quebrou o subir do meu pedido
Para que eu bebesse imagens decompostas
À luz de um pôr de sol enlouquecido.
Sophia de Mello Breyner Andresen, in Dia do Mar
Brotou caladamente em minha volta
Pra que eu perdesse as horas uma a uma
Sem um gesto, sem gritos, sem revolta.
Quem poderá saber que estranhos laços
E que sabor de morte lento e amargo
Sugaram todo o sangue dos meus braços -
O sangue que era sede do mar largo.
Quem poderá saber em que respostas
Se quebrou o subir do meu pedido
Para que eu bebesse imagens decompostas
À luz de um pôr de sol enlouquecido.
Sophia de Mello Breyner Andresen, in Dia do Mar
S/ título
A Palavra vítima é exacta, dura, inequívoca e não precisa de adornos para exaltar a sua razão.
Luís Sepúlveda , in O General e o Juíz
Luís Sepúlveda , in O General e o Juíz
Aos olhos dar o Tâmega
Podia agora aos olhos dar o tâmega a beber.
Ou esta tarde dizer do rosto à quietude das mãos,
enquanto arde. As ervas devoram a esperança.
Lentamente, as margens.
Outubro volta a prender raízes no coração.
Que vento se apressa a ler na boca esta noção
de outono?
Vergílio Alberto Vieira, in a idade do fogo.
Ode à Intimação da Imortalidade.
Though nothing can bring back the our
Of splendor in the grass, of glory in the flower;
We will grieve not, rather find
Strength in what remains behind.
Wordsworth (1770-1850).
Embora nada possa fazer voltar a hora
Do esplendor na relva, da glória na flor;
Não nos lamentaremos, antes procuraremos
A força no passado.
Tradução livre
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